24.10.08

Outono




Uma lâmina de ar

Atravessando as portas. Um arco,

Uma flecha cravada no outono. E a canção

Que fala das pessoas. Do rosto e dos lábios das pessoas.

E um velho marinheiro, grave, rangendo o cachimbo como

Uma amarra.

À espera do mar. Esperando o silêncio.

É outono. Uma mulher de botas atravessa-me a tristeza

Quando saio para a rua, molhado, como um pássaro.

Vêm de muito longe as minhas palavras, quem sabe se

Da minha revolta última. Ou do teu nome que repito.

Hoje há soldados, eléctricos. Uma parede

Cumprimenta o sol. Procura-se viver.

Vive-se, de resto, em todas as ruas, nos bares e nos cinemas.

Há homens e mulheres que compram o jornal e amam-se

Como se, de repente, não houvesse mais nada senão

A imperiosa ordem de (se) amarem.

Há em mim uma ternura desmedida pelas palavras.

Não há palavras que descrevam a loucura, o medo, os sentidos.

Não há um nome para a tua ausência. Há um muro

Que os meus olhos derrubam. Um estranho vinho

Que a minha boca recusa. È outono.

A pouco a pouco despem-se as palavras.


antónio gedeão

1 comment:

Anonymous said...

Boa!
Gosto, e gostei.

Um abraço. Espero que estejas bem mano, e não triste como o Outono. ;)

Alf