Por Mário Crespo.
Façamos de conta que é normal a sequência deentrevistas do Ministério Público e são normais e de boa práticademocrática as declarações do procurador-geral da República. Façamosde conta que não há SIS. Façamos de conta que esta democracia está afuncionar e votemos. Votemos por unanimidade porque de facto nãointeressa. A continuar assim, é só a fazer de conta que votamos.
Façamos de conta que nada aconteceu no Freeport. Que não houveinvulgaridades no processo de licenciamento e que despachosministeriais a três dias do fim de um governo são coisa normal. Quenão houve tios e primos a falar para sobrinhas e sobrinhos e a referirmontantes de milhões (contos, libras, euros?). Façamos de conta que aUniversidade que licenciou José Sócrates não está fechada no meio deum caso de polícia com arguidos e tudo.
Façamos de conta que José Sócrates sabe mesmo falar Inglês.Façamos deconta que é de aceitar a tese do professor Freitas do Amaral de que,pelo que sabe, no Freeport está tudo bem e é em termos quid jurisirrepreensível.Façamos de conta que aceitamos o mestrado em Gestão comque na mesma entrevista Freitas do Amaral distinguiu oprimeiro-ministro e façamos de conta que não é absurdo colocá-lo numadas "melhores posições no Mundo" para enfrentar a crise devido aosprodígios académicos que Freitas do Amaral lhe reconheceu.
Façamos de conta que, como o afirma o professor Correia de Campos,tudo isto não passa de uma invenção dos média. Façamos de conta que o"Magalhães" é a sério e que nunca houve alunos/figurantes contratadospara encenar acções de propaganda do Governo sobre a educação. Façamosde conta que a OCDE se pronunciou sobre a educação em Portugalconsiderando-a do melhor que há no Mundo.
Façamos de conta que Jorge Coelho nunca disse que "quem se mete com oPS leva". Façamos de conta que Augusto Santos Silva nunca disse que doque gostava mesmo era de "malhar na Direita" (acho que Klaus Barbiedisse o mesmo da Esquerda). Façamos de conta que o director do Sol nãodeclarou que teve pressões e ameaças de represálias económicas sepublicasse reportagens sobre o Freeport. Façamos de conta que oministro da Presidência Pedro Silva Pereira não me telefonou a tentarsaber por "onde é que eu ia começar" a entrevista que lhe fiz sobre oFreeport e não me voltou a telefonar pouco antes da entrevista a dizerque queria ser tratado por ministro e sem confianças de naturezapessoal.
Façamos de conta que Edmundo Pedro não está preocupado com a "falta deliberdade". E Manuel Alegre também. Façamos de conta que não éinfinitamente ridículo e perverso comparar o Caso Freeport ao CasoDreyfus. Façamos de conta que não aconteceu nada com o professorCharrua e que não houve indagações da Polícia antes de manifestaçõeslegais de professores.
Façamos de conta que é normal a sequência de entrevistas do MinistérioPúblico e são normais e de boa prática democrática as declarações doprocurador-geral da República. Façamos de conta que não há SIS.Façamos de conta que o presidente da República não chamou o PGR sobreo Freeport e quando disse que isto era assunto de Estado não queriadizer nada disso.
Façamos de conta que esta democracia está a funcionar e votemos.Votemos, já que temos a valsa começada, e o nada há-de acabar-se comotodas as coisas. Votemos Chaves, Mugabe, Castro, Eduardo dos Santos,Kabila ou o que quer que seja. Votemos por unanimidade porque de factonão interessa. A continuar assim, é só a fazer de conta que votamos.
Artigo de opinião publicado no JN [09 Fev. 2009]